sexta-feira, 23 de novembro de 2007

João

André não foi trabalhar, passou o dia enfurnado em casa. Quase não levantou do sofá da sala, saiu duas ou três vezes para ir ao banheiro no máximo. Quando de repente, levantou-se tomou um café sem açúcar, foi ao banheiro e ficou algum tempo se olhando no espelho. Num acesso de fúria desferiu um soco na parede, por algum motivo não quis quebrar o espelho. Não ganhou sete anos de má sorte, mas ganhou sim uma mão direita inchada e dolorida.

Com cuidado passou gelol e passou uma faixa na mão direita, doía muito. Tomou outro café, acendeu um cigarro e saiu de casa. Caminhou pelo bairro todo fumando um cigarro atrás do outro, até chegar num viaduto. Parou, pensou, acendeu outro cigarro e repensou no que faria da vida. Até que Roger, um amigo, que por acaso andava de bicicleta, viu que André estava meio estranho com aquele olhar distante. Achou que tinha algo errado e foi falar com ele.

André quando viu que o amigo se aproximava, foi subindo na beirada do viaduto. Roger disse para ele ter calma, não queria confusão e só queria falar com ele. Só queria saber o motivo de ele estar ali em cima do viaduto daquela maneira. O semi-suicida parecia decidido, mas resolveu contar ao amigo o que tinha acontecido para ele tomar essa atitude drástica. Roger sugeriu um boteco, para que a conversa fosse mais tranquila, mas André não caiu na tentativa do amigo de faze-lo desistir do salto.

Então de cima da mureta, André começou a falar sobre seu infortúnio. Contou que na noite anterior conheceu uma mulher incrível, bonita, inteligente e com um senso de humor contagiante. Ele mesmo ficou se perguntando como um mulher daquelas foi achar graça num sujeito como ele. Roger ouvia tudo sem dizer uma palavra, apenas balançava a cabeça como quem está avaliando a situação do amigo. E André contou sobre a noite que passaram dançando, bebendo e se divertindo muito.

Roger faz uma interrupção e diz: - Espere um pouco, deixa eu ver se entendi. Você conheceu uma mulher maravilhosa. Passaram a noite juntos. E agora você quer se atirar de cima do viaduto?- conclui o amigo sem entender direito. André respira fundo, faz um gesto de que vai se jogar. Porém o amigo pede para que antes de se jogar diga se ele vai se jogar por causa da mulher da festa anterior. Com uma lágrima que teimou em aparecer, apesar da tentativa de manter a serenidade, André resolve esclarecer o caso.

- Cara, foi mais ou menos isso. Tem mais um detalhe que muda todo o contexto. - o amigo não se contém e pede para que fale logo o que houve. Outra lágrima escorre no rosto de André que, desta vez, não faz questão de segurar. Rubro de aflição ou vergonha começa a falar. – então cara, bebemos, dançamos e nos divertimos até não poder mais. depois disso os efeitos de tanta bebida e algumas substâncias ilegais fomos para minha casa...- André faz uma pausa olha para o céu, da um suspiro e novamente faz aquele gesto de queria se jogar naquele instante.

Roger não aguentava mais esperar para ouvir o final da história, implorou para André contar o que aconteceu. Este por sua vez, disse que como iria morrer mesmo não se importaria em contar a alguém. E recomeça a contar – Continuando, no meio do caminho eu passei mal e aquela ingrata me levou até minha casa. Chegando lá eu apaguei, não lembro de quase nada. Só que ela me ajudou a chegar até o banheiro para vomitar e que dormimos juntos - nisso Roger interrompe e diz que não era só porque a mulher passou a noite com ele e depois sumiu no dia seguinte que ele deveria se matar.

André finalmente diz que quer terminar de contar o que houve. - Cara, não é só isso não. Hoje cedo quando acordei ouvi um barulho, tinha esquecido completamente que tinha alguém lá em casa. Levantei-me e quando olho no banheiro, com a porta aberta lá estava ela. A lembrança da noite anterior veio como um filme na minha cabeça. Aquilo no banheiro foi a cena mais terrível da minha vida, ela estava mijando (perdão pelo termo) em pé. Quando ela, quero dizer ele saiu perguntei quem era ele. E ele disse que se chamava Kátia Flávia. Perguntei nome verdadeiro, ele me disse que se chamava João. Agora me diga é ou não é motivo para eu me jogar daqui? - disse com uma vergonha quase palpável.

Roger colocou a mão na cabeça, pensou um pouco e disse: - é você tem razão, não sei porque você não pulou ainda.

Fim

Um comentário:

Anônimo disse...

Adorei! Seu blog é ótimo! Acessei pelo "Blônicas". Parabéns! Tenha uma seman produtiva e feliz!