segunda-feira, 25 de junho de 2012

O Trabalho


Fechou o laptop com a sensação de dever cumprido. Foram mais de oito horas ali de frente para a tela digitando sem parar. Comeu apenas o que tinha estocado na gaveta da escrivaninha e uma garrafa quente e sem gás de Coca-cola foi toda a sua hidratação. Mas, pensou, o esforço valeu a pena.

Quando levantou e sentiu a espinha estralar foi ainda mais prazeroso. Era como se o corpo estivesse agradecendo após suportar o dia inteiro sem reclamar. Aproveitou para estralar também outras peças móveis e dar algumas batidinhas leves nos músculos já semiatrofiados para relaxá-los. Eles mereciam.

Sentia-se satisfeito com a própria performance. Quando se propôs a sentar naquela mesa e trabalhar já sabia que não seria coisa de meia hora. Da última vez tinha levado dias. Mas ele era sempre assim: quando tinha um objetivo definido não havia barreiras para lhe segurar. Fosse o objetivo profissional, pessoal ou de caráter investigativo.

Pois quando entrou no banho e começou a repensar em todo o avanço do dia começou a entrar em pânico. E se não fosse realmente aquilo? E se tudo o que havia escrito era besteira, conversa para boi dormir? Não tinha como saber antes da noite seguinte, e aquela incerteza sobre o próprio sucesso o atormentava ainda mais do que o medo de ter estragado tudo.

Decidiu então que após jantar iria reler tudo o que havia escrito. Da primeira letra que teclou até o último ponto. Não teria como suportar a espera pelo resultado; era preciso checar se havia algum deslize, alguma falha que pudesse de alguma forma colocar tudo a perder. Ainda que estivesse tão certo do êxito ele era um daqueles perfeccionistas que jamaos se permitem errar.

Ao ligar de novo o computador sentiu que o coração já batia mais depressa. Pouco importava se há quinze minutos tudo lhe parecia perfeito, o trabalho fora supostamente bem-feito e um futuro radiante lhe aguardava a partir dali: qualquer palavrinha fora de lugar teria um efeito devastador tanto imediato quanto nas necessidades vindouras.

Mas então veio a surpresa: logo ao abrir o navegador já se anunciou um e-mail. Era dela, e sem assunto nenhum. O corpo da mensagem trazia as seguintes frases: "Adorei conversar com você hoje o dia inteiro. Ninguém sabe prender a minha atenção como você. Espero que possamos fazer isso mais vezes".

Deligou o computador e respirou fundo: realmente foi um trabalho bem realizado.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Corinthians e Boca Juniors fazem a final da Libertadores


O Corinthians chega a sua primeira final da Copa Libertadores da América. Já o Boca Juniors fará a sua décima final da competição. Enquanto para o Corinthians o Título da Libertadores é algo inédito, para os argentinos a conquista em 2012 seria a sua sétima.


O Corinthians sofre desde muito tempo com o fato de nunca ter vencido a competição. Uma vez que todos os grandes rivais paulistas já conquistaram a América. Esta obsessão caminha com o Timão a muito tempo. Tanto que a muito tempo clube e torcida não deixam de falar na tal Libertadores.


Falar em obsessão pela Taça Libertadores é falar na força que tem o Boca Juniors. Os xeneizes são tão obcecados pela Libertadores que após ganhar uma, sua inflamada torcida exige outra. Lembrando que caso o Boca vença esta edição da Copa Libertadores alcança o Independiente com sete conquistas.


Para o Corinthians é uma oportunidade de vencer a América e fazer parte do rol de Campeões da América. Também acaba com a piada dos rivais. O Boca Juniors, por sua vez, além do título, briga pela alcunha de Rei de Copas da Argentina. Por enquanto o Rei de Copas é o Independiente que já triunfou sete vezes na Libertadores.


A quem interessar possa, irei torcer pelos maloqueiros.


Fim

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Desilusão


Tudo o que ele queria era conhecer a filha do Anacleto. Morena, lábios carnudos e com os negros cabelos tocando-lhe a cintura, Paulinha era o exemplo clássico de beleza suburbana. Sozinha ela já havia causado todo tipo de rebuliço nos arredores da Vila Santa Helena -- e Valdo pensou que decididamente chegara a sua vez.

O primeiro passo para se aproximar da pequena foi se envolver mais nos assuntos da comunidade. Anacleto tinha um quê de representante popular, e na visão do desabastado Valdo só através do velho seria possível chegar mais perto da Paulinha. Para ela não havia distinção entre pobre e rico: um ela ignorava; o outro, namorava.


Na primeira reunião que teve Valdo chegou cedinho, cedinho. Figura rara por ali, logo chamou a atenção de Roberto Carlos, o puxador de samba oficial da vila e representante comercial de uma marca de calcinhas. "Veio fazer o quê aqui, Valdo?", perguntou. No que não obteve resposta, insistiu: "Alguém roubou a sua casa?" Era só para exigir segurança que um novato passava a frequentar aqueles encontros.


Valdo olhou torto para o inquisidor. Eram amigos, mas Roberto Carlos já havia se engraçado para cima de Paulinha e, portanto, tornou-se inimigo mortal. Quando lhe virou as costas chegou a ouvir um insulto, mas preferiu ignorar. Sua missão era clara: procurar Anacleto e perto dele permanecer até o fim da reunião. Se conseguisse ser convidado para formar par no jogo de truco que fatalmente ocorria na confraternização logo em seguida estaria com a faca e o queijo na mão.


Quando Anacleto entrou ofegante no salão todo mundo imediatamente se virou. Ele estava com o paletó inteiro ensanguentado, mostrando com um corte profundo bem no meio da testa e um dos braços aparentemente torto, como que quebrado. Gritava: "eu mato aquele lazarento. Se ele aparecer na minha frente de novo, eu mato aquele desgraçado filho de uma égua".

Apesar da comoção generalizada ninguém quis dirigir a palavra ao moribundo. Sem a vaga ideia do que havia acontecido e com seu objetivo em mente, Valdo foi ao encontro do velho. "Que se passou, Anacleto?", perguntou-lhe com o rosto consternado. "Tentaram assaltar sua mercearia, é?" Eis que o outro, aflito, respondeu-lhe: "qual o quê! Isso foi um maldito que tentou cortejar a minha filha. Não admito Paulinha de conversinha com outro cara por aí".

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Homem Aranha nunca mais


Pedro sempre chegava ao trabalho como um zumbi. Todo escangalhado e com o semblante de quem não dormia direito há muito tempo. As xícaras de café , as cobranças do chefe e as piadas dos colegas eram suas companheiras durante o dia.

Ele não se deixava abalar. Tirava tudo de letra, apesar das olheiras e da cara de cansado, ainda mostrava um sorriso. Até mesmo o apelido WD, de Walking Dead, que ganhou dos colegas da firma. Até imitava um zumbi quando ia buscar um café. A rapaziada se amarrava na imitação.

Porém, todos os dias era a mesma coisa. A cara de cansado, a brincadeira de zumbi, as piadinhas com Walking Dead, o café, as cobranças do chefe, enfim, a rotina. O que ninguém sabia, exatamente, é o que Pedro fazia a noite. Para uns ele era dançarino em uma boate. Para outros ele era usuário de drogas. Ainda tinham alguns que achavam que Pedro era uma desses ‘garotos de aluguel’.

Certa manhã, como tantas outras, Pedro chega ao trabalho e encontra os colegas gargalhando com o jornal do dia nas mãos. Pedro se aproximou para ver do que eles riam. Eles riam da manchete que mostrava o Homem Aranha com o uniforme rasgado nos fundilhos. Pedro fechou a cara e foi para sua mesa, sem dizer uma única palavra. Misteriosamente, depois daquele dia o Homem Aranha nunca mais foi visto e o crime tomou conta da cidade.

Fim