terça-feira, 9 de novembro de 2010

A história de Nelson e Lorena

Torcer por um clube de uma cidade, ou Estado, diferente da cidade da sua, é complicado. Ao ponto de alguns conterrâneos rechaçarem aqueles que torcem por times “de fora”. O que dizer do torcedor da Seleção Brasileira que sofre com a Canarinho jogando sempre longe de terras tupiniquins. Se bem que da mesma forma que os craques, ela foi tomada de “assalto” pelo$ euros. Mas isso é prosa para outro post.

Vamos manter o pensamento aqui nesta Brasila mesmo, e olhar a situação de Nelson. Nelson é um cara tão comum, tão ordinário, que não desperta muito interesse assim a uma primeira vista. Ele vivia com os pais, tinha alguns planos, como passar o carnaval em Salvador, comprar um Playstation 3, trocar de carro, essas coisas. Sua grande paixão era a Portuguesa de Desportos. Sim era um fã da Lusa.

Não era descendente de portugueses, o pai italiano e a mãe uma nordestina filha de pai holandês e mãe brasileira. Em se tratando de brasileiro até pode ser que alguma coisa de português pudesse aparecer em um exame mais detalhado. Mas o fato é que Nelson era um torcedor da Lusa, com direito a tatuagem e carteirinha de sócio do clube. Mesmo longe.

Então numa bela tarde de sábado em Curitiba Nelson estava em um bar, desses com luz baixa e cardápio peculiar e público fiel. Neste dia estava quase vazio. Sentou junto ao balcão, pediu uma cerveja, um rolmops e perguntou para o sujeito que limpava o balcão, com um pano úmido que carregava no ombro, qual era o jogo da rodada. “Hoje tem Cruzeiro e Portuguesa”, disse o garçom que nem tirou o palito da boca para responder.

Nelson devorou o rolmops em duas dentadas. Tomou a cerveja toda e pediu mais uma. Cândido, o cara do bar, percebeu o escudo da Lusa tatuado no braço esquerdo de Nelson. “Deve ser difícil torcer pra Portuguesa”, disse. Era que precisava para que os dois se enveredassem por uma longa prosa sobre futebol até o começo do jogo.

De repente, não mais que de repente, entra no bar uma moça se acomoda em uma mesa perto da janela e com boa visão para a TV. Muito bonita, ruiva, cabelo curto, calça jeans, camiseta branca com uma jaqueta vermelha escura. Nelson olhou, tentou disfarçar, mas não conseguia desviar o olhar da moça. Cândido percebeu e puxou conversa com a moça, mostrou o cardápio e voltou a conversar com Nelson sobre futebol e sua curta carreira no Combate Barreirinha.

O jogo começou e tanto Nelson, quanto a ruiva ficaram com olhar fixo na TV. Ele descrente na existência de outros fãs da Lusa, imaginou que a ruiva fosse uma torcedora da Raposa. Isso fez com que ele, pelo menos durante o jogo, prestasse mais atenção ao jogo da Lusa do que a ficar olhando para a bela senhorita da mesa perto da janela.

Cruzeiro no ataque. A bola passa tirando tinta da trave. Nelson coloca as duas mãos na cabeça. A ruiva solta um “uhhhh”. Agora ele tinha certeza que a moça era uma mineira e que estava ali “vuduzando” a sua Lusa. O clima no bar ficou pesado. Nelson evitava olhar para a moça. Ela agia como se o gajo não estivesse ali.

Cândido chega com o pedido da moça. Uma cerveja, uma porção de amendoim, um rolmops (pasmem!) e uma porção de fritas com bastante bacon. Nelson ficou de boca aberta com o apetite da moça. Mas logo lembrou que ela era uma inimiga, e que se fosse para ficar ali secando a Lusa, ela que procurasse outro bar.

Lusa no ataque. Nelson se levanta, Cândido se estica no balcão para ver melhor o lance. A ruiva aperta com força um guardanapo na mão direita. O camisa 7 da Portuguesa acerta a trave do goleiro mineiro. Novo ataque da Portuguesa, o beque cruzeirense faz falta na entrada da área. Novo momento de tensão no bar. Nelson cruza os dedos. Ela não fala nada, mas mexe os lábios como quem diz: agora vai agora vai. Atrás do balcão, Cândido coloca o pano no ombro esquerdo. Parece estar torcendo para a Lusa.

O zagueiro da Lusa toma pouca distância, mesmo assim solta uma patada. A bola passa no meio da barreira. O goleiro da uma triscadinha na bola. A pelota, caprichosa, acerta o travessão, quica em cima da a linha, volta no travessão e morre no fundo da meta cruzeirense. Nelson grita, Cândido vibra rodando o pano sobre a cabeça e a ruiva bate palmas e diz “é isso ai Valdir” “solta a pancada mesmo” “luusaaa luuusaaaa”.

Nelson se toca que a ruiva também torce pela Portuguesa. E não era só isso. Além de linda, ela tomava cerveja, comia rolmops e pelo visto ainda adorava bacon. Ele investiu no flerte, ela correspondeu. Dias depois ela já não era só a ruiva do bar do Cândido, agora ela era Lorena. Casaram e hoje vivem juntos em Florianópolis, onde ganham a vida com a padaria que abriram.

Cândido conta até hoje para seus clientes a história de amor que viu nascer dentro do seu bar. Ele também faz questão de lembrar que o jogo terminou 4 x 1 de virada para os mineiros, mas isso não importa. Afinal, diante do amor o que mais importa!?

Fim