quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

As Suas Gírias São Idiotas

Quando estou com a minha turma de amigos a gente costuma dizer que “não confia” em certos tipos de pessoas. “Não confio em quem não bebe” foi a primeira das máximas, mas já houve adendos como “não confio em quem torce para dois times” e até “não confio em maestros” – esta, aliás, vai até virar uma comunidade no Orkut porque um camarada aposta a própria honra que muitos além dele não acreditam no “homem da batuta”.

Mas esse não é o ponto onde quero chegar. Quero chegar ao seu ponto G, gata. O negócio é que outro dia eu disse numa roda “não confio em quem não bebe” e uma gaja fez o que ninguém tinha ousado fazer até então: perguntou solenemente o porquê da minha não-confiança.

Caríssimos e pouquíssimos leitores, não sei se isto já aconteceu com vocês, mas ser perguntado do motivo pelo qual você fala uma coisa que já diz há tanto tempo é desesperador! Você fica imaginando quantos outros já não devem ter achado aquilo completamente idiota e só não tiveram coragem ou interesse em confrontar. O pior é que, passada esta fase, você se põe a pensar em todas as outras coisas que costuma dizer e achar normal e que na verdade não fazem o menor sentido para aqueles que não falam as mesmas coisas que você e têm o desprazer de ouvi-las.

E uma coisa eu lhes digo: toda galera tem suas frases e/ou gírias que não parecem idiotas para o grupo (porque “tem um contexto”), mas que na verdade são ridículas e ordinárias mesmo para aqueles do próprio grupo que um dia se põem a pensar ao menos um pouco nelas. É que quem ta de fora ouve e não discute, até porque nunca tem argumentos necessários para isso – “ele está fora do contexto” elimina qualquer possibilidade de o intruso convencer a turma de quão imbecis eles estão sendo –, e quem ta na turma aprende a imbecilidade sem fazer muitos questionamentos porque... bem, porque está na turma, oras, e essas coisas começam sem muitas explicações lógicas.

Antes que alguns xiitas entre vocês venham me xingar por estar “falando mal” da sua turma usando gírias ridículas, devo dizer que a minha é a pior de todas. Nós, os caras da minha galera, é que falamos mais coisas bestas por cada frase com sentido no Brasil. A gente pode falar e rir de todas pessoas num ônibus sem que ninguém saiba que está sendo alvo de chacotas. Então, meu caro, eu não estou te criticando – e muito menos a nós mesmos. Estou apenas constatando um fato. Isso foi fruto de muita observação empírica.

É. A muita raiva que passei indo em churrascos de galeras alheias às minhas e escutando aquele bando de asneiras que não tinham a menor graça (para mim).

Sobre a pergunta citada no começo do texto, ela só serviu mesmo de mote para pensar em tudo isso. Eu consegui responder prontamente e convencer a menina de que não se deve mesmo confiar nas pessoas que não bebem – o que prova que pelo menos esta nossa frase-gíria não é tão sem sentido assim. Explico o lance todo para vocês na próxima semana.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O Amor Era Lindo

Então, do nada, o telefone tocou. Era Suzanna.

Suzanna é uma ex-namoradinha de infância que resolveu voltar de repente. Não sei, parece que se apaixonou de novo. Maldito Orkut, que permite estes reencontros – digamos – macabros.

O fato é que hoje Suzanna não é mais a mesma. Quando crianças éramos daqueles “namorados” que planejavam até o nome dos filhos. Trocávamos cartas de amor, Suzanna e eu, que chegavam a ter mais de dez páginas! Para meras criancinhas isso era muito, muito mesmo. Ela era maravilhosa; o amor da minha vida.

Mas o tempo passa, minha gente. E como passou para meu ex-amor-eterno: fora os vários quilos a mais que ela resolveu ganhar nesses últimos 9 anos (coisa que, dependendo, a gente pode sempre relevar), seu cabelo virou algo parecido com uma folhagem de milho, seco, duro e muito arrepiado. Além disso, ela deve ter literalmente apanhado bastante na vida, pois pude notar, durante o nosso fatídico reencontro há pouco mais de um mês, pelo menos três buracos na dentição da moça – sem contar os dentes do fundo.

É… o amor era lindo.

O celular vibrava no bolso da calça. Relutei, relutei, mas atendi. “Oi; não desliga”, disse ela antes que eu pudesse falar alô. “Preciso mesmo falar com você”. Aquela voz parecia a de alguém que chorou compulsivamente por mais de dez horas. Tremia, gaguejava, pigarreava. Senti uma ponta de preocupação – mas nenhum pingo de compaixão. Disse-lhe “precisa mesmo ser agora? Estou ensinando umas coisas de adulto para o meu irmão. Sabe como é, o piá tá crescendo”. Jogávamos Winning Eleven.

“Sim, precisa”, ela gritou, e nessa hora até pausei o jogo. Olhei para o meu irmão e fiz sinal que esperasse. Meu coração estava apertado; o que aquela criatura estranha queria comigo, àquela hora? Certamente iria dizer que me amava, que sempre me amou e que não podia viver mais um minuto sequer sem mim. Nada mais óbvio.

E diria mais, pensei. Diria que, se eu não fosse até ela naquele exato momento, saltaria do 15º andar direto para o meio da linha do trem, para não dar chance de o suicídio falhar. Temi pelo que seria pior: se ela se matasse eu certamente seria indiciado e preso por não evitar a morte de uma jovem.

“Sim, precisa!” Depois daquela frase o telefone ficou mudo por longos segundos. Pareceu que aquele grito assustara aos dois. Se de um lado se escutava a respiração ofegante de uma moça em vias de colapso, de outro só se ouvia o som vibrante de uma torcida em tela de pause. É, definitivamente eu não estava nem aí. Talvez um pouco preocupado com o fato de ela querer se matar, mas só um pouco.

Finalmente, depois de outros cinco longos segundos, ela continuou: “sabe que gosto muito de você, né?” Pronto; bastou isso para confirmar todos os meus medos. Ela realmente me amava e certamente já estava sentada no parapeito da janela com uma perna para fora. Senti minhas mãos suarem. Essas coisas sempre começam com um “te adoro” e acabam na hollywoodiana frase “não consigo mais viver sem você”, além de um corpo estirado na calçada.

Fechei os olhos e quase me pus a chorar; tudo o que eu não precisava naquele instante da vida era de uma feia suicida apaixonada por mim. Essas são o tipo mais difícil de se livrar sem que haja qualquer conseqüência.

Então lhe disse “fala, mas cuidado com o que você vai falar”, e logo me arrependi. Tinha acabado de dar uma brecha para ela dizer tudo o que se passava naquela cabeça tola. Fiz-me de interessado, o que pode ser muito perigoso se sua interlocutora já sonhou com aquele momento centenas de vezes na vida.

Senti a respiração ofegante cessando do outro lado. Ela falou “sabia que você iria me escutar”, e até pareceu mais animada. Pensei comigo que deveria ir até o fim, já que falei besteira. Tinha que agüentar. Suzanna então respirou fundo, como quem se prepara para mergulhar numa piscina gelada, e disparou:

- Sabe, Carlos, já faz dez horas que eu to chorando. Não agüento mais! Terminei com meu namorado hoje cedo mas ainda gosto dele. Muito. Terminei por pena, sabe? É que eu o traí o Marcelo com aquele ator da novela que estava aí na cidade, sabe? E fiquei com muito peso na consciência. Você me entende, não entende? Eu não agüentaria vê-lo como um corno. Eu o amo, e só o traí porque era o galã da novela e ele deu em cima de mim. Não foi a primeira vez, admito, mas foi a única em que me bateu o remorso. O quê que eu faço? Me ajuda, Carlos!. Me ajuda!