sexta-feira, 1 de junho de 2007

A vida? ou A vida!

O homem é velho, 83 anos. Mas é um vovô brincalhão. Ou melhor: um bisavô piadista e cheio de prosa.
Sua saúde é exemplar, bem como seu humor. Quando não está praticando escalada no Chile ou surfe no Havaí, faz questão de juntar a família para um churrasco, regado, claro, a muito futebol e cerveja.
Todos adoram o velho "Sêo" Wilson. Filhos, netos, bisnetos, vizinhos, esposa, ex-esposas, amantes, frentistas, açougueiros. É um senhor bem quisto pela sociedade, tenha certeza. Também, pudera: ele é deveras simpático, falante, disposto e companheiro. Leva a vida do jeito que qualquer um gostaria. Não há quem não queira tê-lo por perto.
Porém um dia, numa dessas peças que o destino nos prega, "Sêo" Wilson teve um derrame cerebral – dirigindo. Dizem que foi por isso que ele não viu a curva.
Seu Kadett estava a 140 Km/h e entrou de aerofólio e tudo na sala de uma residência. Por sorte não havia ninguém em casa nesse dia, mas o fato é que "Sêo" Wilson teve que ser levado as pressas por uma ambulância.
Ainda desacordado, os médicos fizeram cerca de 20 cirurgias no velho para salvar-lhe a vida. Arrancaram-no as duas perna, um olho, o pâncreas, massa encefálica e tudo quanto é vesícula que se possa imaginar. Conseguiram manter o coração dele batendo.
O cérebro parou, mas o coração continua batendo.
Mesmo assim, "Sêo" Wilson sente dores. Muitas dores. Passa 22 horas do dia sedado por quilos e quilos de medicamentos. Nas duas horas que sobram, o vovô geme de dor. Não mexe um músculo sequer, mas geme de dor.
Os médicos garantem: "com o miocárdio que esse senhor tem, vai viver mais uns 20 anos até que o coração pare de bater". Vai viver 20 anos deitado numa cama, ligado a dez máquinas diferentes, sem comer, sem beber, sem praticar escalada no Chile ou surfe no Havaí, sem churrasco com a família, sem os amigos da vila, sem a vila, sem a vida.
Desses tempo que "Sêo" Wilson tem de "vida", 158.400 horas serão sedados. isso dá 6.600 dias, ou seja, 18, 3 anos. Sem falar que no resto, quando está acordado, "Sêo" Wilson não mexe o corpo; mas geme de dor. Muita dor.
Todos que o amam – ou seja, todo mundo, da Vovó Virgínia ao Padre Tomé – ordenam: "parem as máquinas, pelo amor de Deus!"
Não pode.
Eutanásia, substantivo feminino, segundo o Aurélio "morte serena, sem agonia, pela qual se busca abreviar, sem dor ou sofrimento, a vida de um doente reconhecidamente incurável".
Enfim, não entendo qual é o conceito de vida para ainda proibi-la.

Um comentário:

Anônimo disse...

Como já diria a vidente:
Você tem futuro!!!