quinta-feira, 11 de março de 2010

A partida de Fred

De todos que ali viviam, Fred era o último que alguém desejava que partisse desta para melhor. Sujeito decente, educado, trabalhador, não tinha rabo preso com ninguém. Apesar de longe do estereótipo de atleta, não bebia, odiava cigarros e praticava diariamente longas caminhadas. Não destratava nenhum à sua volta e jamais teve algum inimigo. Era uma mistura de Longfellow Deeds com Pee-Wee Herman, sem contar um quê de Francisco de Assis para com os animais.

Conta-se que uma vez Fred foi chamado à corte às pressas pelo juiz local. Não que tivesse feito algo de errado: o magistrado era um velho amigo que o considerava perfeito para ponderar e mediar um eventual acordo entre as partes em litígio. Não há como se verificar a veracidade dessa informação, mas este é o tipo de anedotas que se contam sobre a importância do rapaz no município.

Sem dúvidas ele deixará saudades. Seu jeito simpático invariavelmente conquistava de velhinhas moradores de rua, de políticos a drogados participantes do programa por ele assistido. Suas visitas mensais ao orfanato da cidade eram mais do que ansiadas. Foi nomeado membro honorário do Rotary Club e da Academia Municipal de Letras sem jamais ter sequer botado os pés uma qualquer uma das duas associações. Fred certamente era mais do que bem quisto pela população.

Seus amigos mais próximos sentirão falta dos saraus que ele costumava organizar, muitos deles com motivações filantrópicas. Ficarão orfãs também de alguém que conseguia com tanta facilidade juntar pessoas para uma inocente partida de Imagem & Ação. Era Fred, por exemplo, quem sempre tinha uma carta na manga para domingos chuvosos, quermesses adiadas ou até mesmo primeiro dia de férias coletivas.

Na ocasião de sua partida, a comoção foi generalizada. Centenas de pessoas acompanharam-no, aos prantos, até o último momento possível. Todos se esvaiam em lágrimas, inclusive bad-boys e lenhadores. Era uma pessoa querida que os amigos perdiam, uma figura histórica que ficará para sempre na memória da cidade.

Em meio a inúmeras coroas de flores, uma enorme faixa patrocinada pela prefeitura resumia o sentimento de todos ali presente. Ela continha os seguintes dizeres:

"Fred Astaire de Oliveira, filho ilustre do município de Santana do Livramento do Sudoeste: sua passagem por nossa terra foi marcante. Nada que um dia aconteceu ou um dia virá a acontecer conseguirá apagar você das nossas memórias. Todo habitante de nosso humilde povoado foi, de uma forma ou de outra, tocado por você, por suas palavras de apoio, por seu incansável desejo de ajudar, por seu infinito sentimento humanitário.

"Fica aqui o desejo de todos para que seu legado permaneça. Que tudo aquilo que você um dia semeou e continuava por fazer até o último instante floresça e gere novos frutos. Que Deus esteja ao seu lado nesta nova etapa, e que seu exemplo seja para sempre seguido pelo bem da nossa população.

"Fred Astaire de Oliveira, obrigado por ser o primeiro Santanense a ingressar numa faculdade. Boa sorte em São Paulo.

"(Povo de Santana do Livramento do Sudoeste)."

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