quinta-feira, 6 de novembro de 2008

O Ford Ka

Eu sou, na verdade e ao mesmo tempo, duas pessoas. Na verdade várias, dependendo da ocasião, mas o importa agora são apenas estas duas: dentro e fora do carro. Isso mesmo. No dia-a-dia, fora do carro, nas conversas à beira do balcão ou no trato com a atendente de telemarketing, comporto-me como um nobre, um lorde inglês, suave e compreensivo tal qual um manso filhote de labrador (desde que isso me seja favorável). No trânsito, porém, a coisa muda de figura: vivo estressado, a 200 por hora, xingando até a mãe da prima da vizinha da coitada que atravessa a rua empurrando seu carrinho de feira lotado de abóboras chinesas. Da porta para fora, um; com as mãos no volante, outro.

O culpado disso tudo, acredite, é o fato de eu dirigir um Ford Ka. Tivesse eu um Opala 78 ou um Omega Suprema, as coisas seriam diferentes. O Ford Ka, por si só, independente do motorista, não é respeitado nas ruas, e ser desrespeitado é o que faz qualquer homem perder a cabeça. Explico. Ninguém quer parar atrás de um Ford Ka no sinaleiro. As pessoas preferem trocar de pista a ter um Ford Ka como "puxador" da fila. O que os outros motoristas não imaginam é que atrás daquele volante minúsculo pode ter um apressado motorista pós-moderno ou o próprio Juan Manuel Fangio. Ford Ka será sempre Ford Ka, aqui ou na Rússia, e ele, talvez pelo seu tamanho, parece não merecer qualquer respeito alheio.

Quem o dirige, sabe: não há moto, por mais pequena que seja, que se digne a deixar a frente do Ford Ka livre num sinaleiro. Elas sempre têm a certeza – mesmo que seja a ridícula Jog ou uma potente Biz 100cc – de que sairão antes do Ford Ka quando a luz vermelha do poste se apagar. Não sei, mas não me parece que o Ford Ka seja tão ruim assim. Já dirigi outro carros 1.0 e eles me pareceram a léguas de distância da potência do Ford Ka. O Fox e o Palio, por exemplo, são infinitamente mais fracos e, digamos, feios que o Ford Ka. Fosse meu carro um fusca, ao menos eu poderia me impor por sua história. Mas não. O Ford Ka é desrespeitado, subjugado e admoestado pelos outros automóveis e motoristas.

Fica aqui meu apelo: não julguem um motorista só por causa do seu carro. Não é porque ele está num Ford Ka vermelho com um adesivo da Hello Kitty ocupando toda a janela traseira (não é meu caso) que ele não conseguirá te ultrapassar na curva. Aquele motor Zetec Rocam é muito mais forte do que parece – e ele me da muitas alegrias diárias, sobretudo quando olho a cara de espanto daquele motorista no Golf GTi se apequenando no retrovisor. Antes de julgar um carro, olhe a cara do motorista: só mude pista se ele for mais baixo que o capô ou  mais antigo que a crise de 29.

Um comentário:

Guylherme Custódio disse...

Posso até concordar em não menosprezar o Ford Ká, mas dizer que o Fox e o Palio são mais feios que o Ká foi defudê!!!